sexta-feira, dezembro 15, 2006

Projeto Brasil 3 Tempos - Comentários/Conclusão

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Exportações Brasileiras
A participação do Brasil no comércio internacional é muito pequena e tudo indica que vai continuar assim. O Brasil não tem Marinha Mercante, realiza a maior parte de suas exportações no regime FOB - Free on Board, não tendo, portanto, como influir na fixação dos preços do frete e não dispõe de companhias de seguro que, efetivamente, tenham participação relevante no mercado. A ausência dessa frota inviabiliza a agregação do valor do frete ao preço do produto exportado. O frete é benéfico para o país onde estiver o centro de decisão da empresa armadora, sendo determinante no preço final.
Levando-se em conta a agenda do Órgão de Solução de Diferenças da OMC, o comércio internacional é uma arena de enormes disputas de interesses onde qualquer argumento é argumento, e qualquer recurso é recurso, para manter ou conquistar mercados. O Brasil é, historicamente, um exportador de matérias primas e não emite nenhum sinal de querer mudar. É, por exemplo, o maior exportados de café em grão, enquanto a Alemanha é o maior exportador de café processado.
A reforma e modernização dos portos brasileiros não encontrará investidores, brasileiros ou não, que tenham interesses comerciais no negócio, exceto para matéria prima bruta, o que afasta o Brasil de qualquer participação maior do que a que já tem.
Para exportações de produtos manufaturados o Brasil é dependente de decisões que não são tomadas aqui e sobre as quais não tem nenhuma influência. Existem exceções, mas a maior parte do potencial exportador brasileiro esta em mãos de empresas transnacionais , que operam em escala global, balizadas por "business plan" sobre os quais o Brasil não tem qualquer conhecimento.
O Brasil encontra-se em uma posição bastante forte na Rodada de Doha, paralizada por divergências entre a União Européia e os EUA. Juntamente com o G-20, do qual é parte, não será por falta de estratégia de negociação ou de manobras diversivas que será enfraquecido, mas o ambiente interno não ajuda. Aparentemente o Congresso Nacional não acompanha o que vai por Genebra, a marcha de tratores sobre Brasilia era tudo o que UE e EUA poderiam querer.
Se vencedor, como tudo indica que será, os países do G-20 terão o que comemorar, o Brasil, que conseguiu ser um dos três atores da Rodada do Desenvolvimento (Doha) e principal responsável pela vitória, não

Protocolo de Quioto
O Protocolo de Quioto divide os países em dois grupos: os que são Parte AnexoI e os que são Parte NãoAnexoI.Os países Parte AnexoI assumem um compromisso de redução de gases de efeito estufa, conhecidos como GHG (greenhouse gases). Os países NãoAnexoI não são obrigados a assumir compromisso algum. O Brasil é Parte NãoAnexoI.
Para que um país seja parte do Protocolo de Quioto é necessário que o seu Parlamento ratifique o Protocolo. Os EUA, maiores emissores de GHG, não ratificaram e não são, ainda, obrigados a assumir compromissos.
É o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo - MDL que permite a venda de Reduções Certificadas de Emissões, cada qual igual a uma tonelada métrica de dióxido de carbono equivalente. É através das RCEs que se faz a comercialização dos créditos de carbono a que se refere o item 17 dos temas estratégicos do Projeto Brasil 3 Tempos.
Embora a BM&F tenha o seu segmento para o comércio de carbono, é em Chicago, na Chicago Climate Exchange, a CCX, que o Brasil realiza a maior parte de seus negócios . A CCX, através de parcerias, opera em Nova York, Montreal e Londres.
Antes da realização da COP/MOP 3, em novembro último, a Secretaria da UNFCCC adotou uma variável do MDL, que permite aos países da UE negociar reduções entre sí (ver postagem anteriores sobre o assunto). Os compradores de RCEs brasileiras são países europeus. Apenas quatro dos países da Europa Ocidental não fazem parte da UE.
A variável ao MDL não é boa para o Brasil e o MDL foi criado por sugestão do Brasil. Na COP/MOP 3 o Brasil propôs a criação de um fundo para créditos de redução de desflorestamento, proposta recebida sem entusiasmo.
A partir da UE e dos EUA surgem pressões para impor ao Brasil metas de redução de emissões devido ao permanente aumento de suas emissões, que o colocam hoje já como o quarto maior emissor de GHG.
Lastreado em sua posição de maior emissor, os EUA possuem totais condiçoes de exigir que os países NãoAnexoI sejam forçados a assumir compromissos em troca de, por sua parte, ratificarem o Protocolo de Quioto e assumir o compromisso fixado em 1997 quando o Protocolo foi aprovado, inclusive pelos EUA.
O primeiro período de compromisso vai de 2008 a 2012 e dificilmente os EUA deixarão de ratifica-lo até lá, estando em curso nos EUA um programa de produção de etanol a partir do milho.
O corte da cana de açúcar, base do etanol brasileiro, é feito após a queima do canavial e é executado por "cortadores" remunerados por tonelada cortada. As queimadas da cana de açúcar, de áreas degradadas para pastagens e do desflorestamento resultante da exploração ilegal de madeira, colocam o Brasil na posição que hoje ocupa como emissor de GHG. Da UE chegam à OMC e a UNFCCC acusações ao Brasil de dumping social, que significa a exploração de mão-de-obra sem respeito aos direitos reconhecidos pela OIT - Organização Internacional do Trabalho. A exploração de trabalho escravo e a morte por esgotamento físico de cortadores de cana não é ignorada nos fóruns de debate sobre o aquecimento da Terra e muito menos na OMC.
Tão certa como é a entrada nos EUA no Protocolo de Quioto é a imposição ao Brasil de compromissos de redução. A não aceitação será fortemente prejudicial a qualquer pretensão internacional que o Brasil tenha ou venha a ter. O Brasil possui a mais avançada legislação ambiental do mundo, embora não a cumpra qualquer alteração será entendida como um retrocesso.
Para concluir, o Projeto Brasil 3 Tempos é inviável, não por lhe faltar qualidades, o projeto é bom, mas sua execução vai requerer o tempo de duas gerações, isso se a mudança começar agora.
Em tempo: O autor desses comentários não tem, e nunca teve, qualquer envolvimento, direto ou indireto, com o Núcleo de Assuntos Estratégicos, não participou e não foi solicitado a participar da elaboração do Projeto.