sexta-feira, agosto 11, 2006

O Brasil, a OMC e a Rodada de Doha - X

O ano de 2003 iniciou-se com poucos avanços, conseguidos apenas nas áreas de serviços e regras comerciais. Questões relacionadas a TRIPS e saúde pública atravancavam o processo de negociação, uma vez que a Decisão Ministerial de Doha recomendava uma solução para que os países membros sem condições de produzir medicamentos pudessem se valer de licença compulsória como recurso para o combate aos problemas de saúde pública, o que levou a tentativas de restrigir este mecanismo aos países de menor desenvolvimento relativo.
Embora não fazendo parte do conjunto negociador de Doha, foi incluído na agenda de modo a viabilizar a Rodada, este tema tinha o seu poder desagregador, na medida em que afetava países do bloco africano e outros, como Brasil e India, que operaram ativamente para evitar que prosperassem propostas de medidas restritivas.
Também problemas decorrentes da Rodada Uruguai, como visto na postagem anterior, esbarravam na ausência de um comportamento construtivo por parte dos países desenvolvidos.
Diversos outras questões acentuavam a incerteza quanto ao bom termo da Rodada de Doha, com destaque para antidumping e subsídios, que chegaram a incluir a proteção a biodiversidade, TRIPS e TRIMS.
Já em março a Conferência Ministerial da OMC, a realizar-se em Cancun no mes de setembro, causava sérias preocupações. Isto porque os prazos estabelecidos em 2002 não tinham sido cumpridos e os que tinham sido marcados para 2003, antes de setembro, também não seriam cumpridos.
Assim sendo a determinação de modalidades para as negociações sobre agricultura, a apresentação das primeiras ofertas em serviços, a determinação de modalidades de negociação de acesso a mercados para bens não agrícolas e a revisão do mecanismo de solução de controvérsias, ameaçava já a solução de continuidade esperada para Cancun. As negociações agrícolas, especialmente, determinava o ritmo dos trabalhos e, em agrícultura, não se chegava a acordo algum. O impasse se acentuava entre a CE e o Grupo de Cairns, segundado pelos EUA. Enquanto a CE buscava acordos específicos em cada área, o Grupode Cairns e os EUA propunham o equilíbrio das negocuações como um todo. A CE insistia, com finalidades protecionistas, em temas estranhos ao mandato negociador.
Era pouco o que se podia esperar, tão pouco que os demais temas em discussão foram contaminados, inclusive, ou principalmente, a revisão do mecanismo de solução de controvérsias. Sem solução nas controvérsias envolvendo a agricultura, os outros temas tornavam-se ambiciosos demais para o esforço negociador.
O Brasil mantinha sua firme posição em defesa da ampla negociação sobre acesso a mercados, redução substancial de apoios internos e eliminação de subsídios a exportação, ou seja, nenhum sinal de contemporização com a CE. Os EUA, por questões de política interna e externa, neste caso MERCOSUL e ALCA, oscilavam em sua posição. Certos temas em política externa, nada condizentes com o comércio internacional, forçavam os EUA a esta oscilação.
Enquanto setembro e Cancun não chegavam, EUA e CE reuniram-se em Bruxelas e, como era de esperar, não chegaram a acordo algum, a Nova Zelandia organizou, e presidiu, um encontro à margem da OCDE, Egito e Austrália, esta reunindo o Grupo de Cairns, realizaram reuniões ministeriais.
Na OMC os trabalhos ganhavam ritmo em busca de um resultado aceitável em Cancun, de modo a evitar o desgaste da OMC e a manutenção do processo de liberalização comercial. Buscava-se, pelo menos, preservar o mandato e o prazo de Doha. (continua)