quarta-feira, agosto 23, 2006

O Brasil, a OMC e a Rodada de Doha - XVIII

A primeira reunião efetiva e formal da OMC após o encerramento da Conferência Ministerial em Hong Kong , realizou-se em fevereiro. Embora Agricultura e NAMA fossem os temas centrais da Rodada de Doha (as reações à Declaração Ministerial de Hong Kong deixaram isso claro), procurava-se, ainda, que as movimentações negociadoras se realizassem simultaneamente em todas as áreas. Apesar disso, ou por isso, não foi estabelecida nenhuma obrigação adicional para os países membros e nem o que deveriam fazer.
Hong Kong fornecera a orientação política para a conclusão da Rodada de Doha em 2006, mas essa orientação, embora do consenso geral, não parecia que iria ser seguida. O World Economic Forum realizado em Davos, Suiça, no mês de janeiro, não despertara consciências para o confronto entre agricultura e NAMA. De qualquer forma o Diretor Geral da OMC distribuiu um documento com as linhas gerais das negociações para 2006.
Os grupos negociadores já haviam iniciado os trabalhos no mês de janeiro dada a exeqüibilidade do prazo, até fins de abril.
Em agricultura sabia-se que as decisões seriam políticas, daí porque seria necessário que trabalhos técnicos buscassem esclarecer o processo de decisão política. Mas havia pouco a fazer.
O Brasil, em nome do G-20, fez uma declaração na qual expressava que resultados ambiciosos em agricultura eram essenciais. Admitia avançar em outras áreas, mas condicionava esse avanço aos resultados em agricultura. As divergências internas no grupo negociador, a começar pelo prazo estabelecido, até 30 de abril, limitado para uns, obrigatório para outros, estendiam-se ao acesso a mercados, principalmente os bens não-agrícolas (NAMA). Questões de política interna de cada país pareciam refletir-se nos grupos a que pertenciam e, como não podia deixar de ser, nas negociações agrícolas. E essas questões eram muito diferentes.
Era um processo extremamente complexo, que provocava um intenso processo de consultas e reuniões informais entre os membros de grupos negociadores diversos. Os avanços, ou não, em outros grupos influiam diretamente no ritmo da cada grupo. Havia um entrecrusar-se de interesses, soluções, divergências e caminhos alternativos.
O NAMA, não apenas iniciou os seus trabalhos algumas semanas após agricultura como também as suas principais delegações concentraram -se em consultas informais e em exercícios de simulação em NAMA e agricultura, o que levou a um rendimento menor dos trabalhos.
Os produtos não-agrícolas têm relação com a agricultura relativamente a alguns produtos, outros, que de modo algum se relacionam, ao menos em princípio, por razões outras, dificultavam o consenso no grupo negociador e influenciavam o outro grupo. Foi o caso dos automóveis, sendo o Brasil produtor e exportador. Como é, igualmente, produtor e exportador de etanol, combustível alternativo à gasolina, a posição do Brasil, e de outros membros do G-20 candidatos a grandes produtores de etanol, tornaram a posição do grupo um pouco delicada.
São questões técnicas que se tornam políticas diante de outros países e seus interesses.
No caso dos Serviços, sem nenhum avanço em Hong Kong e um dos temas em confronto com agricultura, igualmente com NAMA, evidenciou-se as dificuldades dos países desenvolvidos com as negociações plurilaterais, pelas mesmas razões apontadas acima, o processo de multiplas consultas e reuniões informais, o que os levou a reiterar posições sobre a importância das negociações e os resultados obtidos em Hong Kong. Como em Hong Kong o avanço tinha sido quase nenhum, a maior parte dos países desenvolvidos concluiu que seus interesses seriam tratados de forma mais adequada em acordos bilaterais. Já a posição dos países em desenvolvimento era contrária às negociações bilaterais simultâneas.
Os demais grupos negociadores procuravam o avanço possível, permitido pelos entraves em Agricultura, NAMA e Serviços. (continua)