segunda-feira, abril 30, 2007

A Multifuncionalidade da Região Nordeste

A Agência Nacional de Água - ANA apresentou o ATLAS NORDESTE - Abastecimento Urbano de Água, cujo objetivo é reunir as informações necessárias à elaboração de projetos para o suprimento de água ao consumo humano nas sedes municipais da região. A água é o principal elemento da multifuncionalidade e o seu uso pelas populações urbanas uma de suas mais importantes finalidades.
Bacias hidrográficas são consequência da topografia das regiões assim como os aquíferos o são do tipo de solo e rochas das áreas onde estão situados. A fonte de ambos são as chuvas.
A região semi-árida brasileira, que constitui a maior parte do nordeste brasileiro, é seriamente afetada pela insuficiente oferta de água ao consumo humano, mas é imensamente rica em outros elementos da multifuncionalidade que compõem o capital natural e - não somente esses, naqueles que se incluem na propriedade intelectual resultante do aproveitamento dos diversos elementos da multifuncionalidade.
O regime de chuvas da região, determinado pelo sistema de ventos alísios, e a distribuição espacial dos recursos hídricos, resultado da topografia, resultam em um abastecimento intermitente agravado pela deterioração dos mecanismos de captação - que provocam elevados índices de perdas, e pela ocorrência de águas salobras ou poluídas.
São oportunos e necessários os estudos da ANA, e grave, complexo e crítico é o quadro geral da oferta de água na região. O semi-árido é assistido por 5 grandes regiões hidrográficas que abastecem com seus mananciais as populações locais e conta ainda com inúmeros aquíferos. A umidade relativa do ar situa-se entre 70,0% e 80,0% na maior parte de toda a região, onde a pluviosidade, com algumas exceções, é inferior a 1000,0 mm, o que indica uma elevada taxa de evaporação.
Ao longo das muitas décadas de ocupação humana desordenada do semi-árido, somente o aproveitamento dos mananciais de superfície foi objeto de interesse, sendo que pouca ou nenhuma importância foi dada as águas subterrâneas. Para o armazenamento de água a céu aberto foram construídos uma enorme quantidade de grandes açudes que, dependentes de chuvas e sujeitos a alta evaporação, nunca representaram a solução adequada para a falta de água que afeta a população local e é em parte causa do crescimento da pobreza na região. O aproveitamento hidroeléctrico dos dois grandes rios do nordeste, o Parnaíba e o São Francisco, com seus imensos lagos, não constituíram em si parte de qualquer esforço para o suprimento de água.
O descaso pelo saneamento, nos aglomerados urbanos, e a lixívia na monocultura extensiva, resultante da produção do açúcar, são partes do problema e embora comprometam a qualidade da água, aparentemente, permanecem ignorados.
O estudo da ANA é voltado unicamente para o aproveitamento do potencial hídrico do semi-árido, pelas informações que reúne importa para qualquer projeto de desenvolvimento sustentável que venha a ser implementado na região, mas não esgota a importância do tema quando relacionado à multifuncionalidade. A preservação dos mananciais, a atenção ao uso da terra e as mudanças no uso da terra, com vista a manutenção da qualidade dos aquíferos, requerem estudos com o mesmo grau de acuidade, mesmo que o objetivo dos governos locais seja apenas, como parece que é, o abastecimento de água para uso urbano.
Um outro projeto do governo federal, em oposição ao apresentado pela ANA, estabelece a transposição de águas do São Francisco para alimentação das outras bacias hidrográficas, excluída a do Parnaíba. A água obtida do rio São Francisco parece ter como destino o uso para irrigação, o que pode ameaçar seriamente os aquíferos por ventura existentes sob as bacias a serem beneficiadas. O uso de fertilizantes e defensivos agrícolas de origem química compromete a qualidade das águas subterrâneas pelo potencial de contaminação que possuem.
Como a atenção é totalmente voltada para a água de superfície, pouco interesse vem despertando a prospecção dos reservatórios subterrâneos, muito mais importantes sob a óptica do desenvolvimento sustentável do que a acumulação de água na superfície, sujeitas aos altos índices de evaporação que são registrados na região nordeste.
Caso a irrigação pretendida seja utilizada para monoculturas extensivas, os danos a biodiversidade local, e às demais multifuncionalidades de que dispõe o semi-árido ( como entendida pela OCDE e pela OMC), aliada ao advento de espécies invasoras, comprometerá seriamente qualquer ambição comercial futura que o Brasil venha a ter para produtos agrícolas. As perdas de produtos resultantes da propriedade intelectual inviabilizará a eventual transformação do semi-árido em campos de culturas agrícolas.