segunda-feira, abril 16, 2007

A Rodada de Doha - Retomando o Curso?

No último dia 15, o Diretor Geral da OMC declarou ao Comitê Monetário e Financeiro Internacional do FMI e Banco Mundial que ainda não havia sido criado espaço para levar a Rodada de Doha a uma conclusão auspiciosa, embora esse objetivo tenha sido reafirmado pelo G-4 (EUA, UE, Índia e Brasil) dois dias antes. Segundo o Diretor Geral a situação não teria mudado o suficiente para uma retomada das negociações, o que leva a desagradável realidade de um possível fracasso.
De acordo com o corpo técnico da OMC, uma conclusão satisfatória da Rodada permitiria uma base mais sólida para o mercado mundial, afetado pelos altos riscos dos mercados financeiros - e, nos últimos meses, do mercado imobiliário dos EUA, bem como pelos desequilíbrios no comércio de bens e serviços.
No início de maio próximo os Ministros dos países chaves da Rodada de Doha - o G-4, estarão reunidos com o objetivo de fechar um pré-acordo sobre o polêmico tema da agricultura. Em julho completará um ano da interrupção das negociações e teme-se que a partir daí torne-se politicamente inviável a sua continuação.
Ao contrário do que afirma o Diretor Geral a situação mudou sim, e muito. A Rodada de Doha deveria ter sido iniciada em 1999 a partir da Declaração Ministerial de Seattle, local da III Conferência Ministerial da OMC.
Naquele ano os EUA haviam se preparado efetivamente para o início de uma nova rodada que teria a agricultura como centro das negociações. O insucesso de Seattle - não houve qualquer declaração, adiou o inicio da Rodada para Doha.
É parte da cultura norte-americana os ambientes que premiam o risco e o investimento e estimulem a eficiência. A sua política agrícola prioriza o agricultor nacional e suas condições de vida, respeitada a orientação para o mercado consumidor que busca preços adequados e maior variedade de produtos.
O objetivo dos EUA em Seattle era acelerar o processo de reformas iniciado na Rodada Uruguai. Em agricultura, pretendiam implementar negociações substanciais a respeito de tarifas, subvenções e outras medidas que distorciam (e distorcem) o comércio. Consideravam, e nada indica que isso tenha mudado, que a União Europeia e seu modelo agrícola fechado, que enfatiza o controle do fornecimento e a regulamentação governamental para a manutenção dos preços agrícolas em um patamar elevado, resulta em excedentes de produção que só podem ser exportados mediante a prática do dumping.
De fato, a política de subsídios agrícolas voltada para a produção alcançou dois terços do orçamento da UE, levando seus formuladores a apoiarem a diversificação, a reestruturação e a evolução das zonas de economia rural. O objetivo europeu ao iniciar-se a Rodada de Doha era o comprometimento máximo de 1/3 do orçamento.
Do ponto de vista dos norte-americanos os subsídios à exportação, quando praticados por grandes produtores, permitem que um país (o seu governo) determine o nível e a direção do comércio apenas tendo como base os seus próprios subsídios, que podem causar a queda dos preços mundiais e impedir que outros exportadores mais competitivos participem do mercado.
O que mudou nesse mercado?
A UE incorporou outros Estados -o último deles depois da Rodada ter sido interrompida, e nenhum deles em condições de garantir a seus próprios agricultores as mesmas condições de vida dos demais Estados membros, não possuindo, mesmo, solidez econômica para aumentar significativamente o orçamento da UE. Tendo como objetivo um dispêndio máximo de 1/3 do orçamento com a agricultura, a UE, agora com um numero de agricultores maior, terá necessariamente que rever suas políticas agrícolas, abrindo assim espaço para uma maior flexibilidade na redução dos subsídios. Os últimos relatórios do IPCC sobre o aquecimento da Terra certamente determinarão a redução das áreas destinadas a agricultura localmente, podendo levar a investimentos na África em busca de matéria prima básica para combustíveis de origem vegetal. Ainda segundo o IPCC o aquecimento do planeta tornará possível a expansão da agricultura para a Sibéria em futuro não muito distante.
Os EUA, pelo seu lado, ao implementar uma política para o etanol a partir do milho, por enquanto, terá menos excedentes para exportação visto que os preços em Chicago para quase todas as commodities agrícolas encontram-se em curva ascendente.
A busca por fontes de combustíveis na agricultura introduz um novo paradigma nos mercados agrícolas ainda não avaliado adequadamente, mas que muito provavelmente terá importância nas políticas agrícolas da UE e dos EUA. A produção agrícola dos EUA é bastante superior ao seu consumo interno, o etanol pode reduzir essa dependência de seus agricultores de mercados externos para seus produtos. O Secretário do Tesouro dos EUA mostra-se bastante otimista com a retomada de Doha, o que indica a existência de caminhos para um acordo com a UE.