sábado, agosto 25, 2007

A Rodada de Doha - Em busca de Acordos

Em Julho último, os Presidentes dos Grupos negociadores de agricultura e de acesso aos mercados para bens não agrícolas distribuíram as minutas dos documentos que contêm as propostas das modalidades baseadas nas últimas posições dos participantes e que refletem o que pode ser acordado.
Desde algum tempo vem ocorrendo uma dissensão entre os participantes sobre esses temas, agricultura e bens não agrícolas. Envolve de um lado o fim dos subsídios à exportação de produtos agrícolas e dos apoios domésticos aos agricultores e causadores de distorções no comércio agrícola mundial por parte dos países desenvolvidos e exportadores, tanto de produtos agrícolas como de bens industriais, e, de outro, a redução dos impostos de importação incidentes sobre os bens industriais por parte dos países exportadores de produtos agropecuários.
Como foi dito acima, os documentos apresentam "propostas de modalidades". Entende-se por proposta o documento que descreve o que é possível negociar em busca de um acordo final. É esse documento que vai provocar uma série de reuniões sobre as modalidades objeto da proposta. Modalidades, no entendimento da OMC, é como fazer alguma coisa.
Os problemas da Rodada - não os únicos, mas os que levaram a sua paralisação, em Julho de 2006, são os subsídios, os apoios domésticos e o acesso aos mercados. A questão é entre os EUA e a UE - União Europeia e os países exportadores de produtos agrícolas, sendo que esses, com exceção dos três desenvolvidos do Grupo de Cairns, são países em desenvolvimento.
EUA e UE querem a redução dos impostos de importação (tarifas de proteção) sobre os seus produtos industriais como compensação pela redução de seus subsídios às exportações agrícolas e aos apoios domésticos que concedem aos seus agricultores. Modalidades, portanto, é como fazer isso. Daí a necessidade de todos os Membros da OMC estarem de acordo em como fazê-lo.
O que emperra a Rodada de Doha são os níveis de redução. Embora todos queiram um comércio equitativo e mais livre, querem ceder o mínimo possível. As condições do mercado internacional, com os preços das commodities agrícolas em alta e a intensa competição entre os produtos industriais, vem favorecendo os exportadores agrícolas.
Esses dois documentos distribuídos em Julho serão analisados nas próximas postagens. Inicialmente, por ser a agricultura o fundamento de qualquer acordo na OMC, será visto aquele apresentado pelo Presidente do Grupo de Negociações sobre a Agricultura.
O documento aborda os seguintes itens:

I - Apoio Doméstico

A - Redução global do apoio doméstico que provoca distorções no mercado: Uma fórmula estratificada.
- Nível de base
- Fórmula estratificada de redução
- Prazo para aplicação e escalonamento
- Tratamento especial e diferenciado
- Outras questões

B - MGA - Medida Global de Apoio total consolidada: uma fórmula estratificada.
- Fórmula estratificada de redução

C - Limites da MGA por produtos específicos
- Disposições gerais
- Tratamento especial e diferenciado

D - Cláusula "de minimis"
- Reduções
- Tratamento especial e diferenciado

E - Compartimento azul
- Critérios básicos
- Critérios adicionais
- Tratamento especial e diferenciado

F - Compartimento verde

G - Algodão: apoio doméstico
- Redução do apoio doméstico destinado à produção de algodão
- Aplicação
- Tratamento especial e diferenciado

II - Acesso aos Mercados (para produtos agropecuários)

A - Fórmula estratificada para as reduções tarifárias
- Base para as reduções
- Fórmula estratificada

B - Produtos sensíveis
- Designação
- Tratamento - corte tarifário
- Ampliação dos contingentes tarifários

C - Outras questões
- Progressividade tarifária
- Produtos básicos
- Simplificação de tarifas
- Contingentes tarifários
- Administração dos contingentes tarifários
- Salvaguardas especiais para a agricultura

D - Tratamento especial e diferenciado
- Produtos especiais
- Mecanismos de salvaguarda especial
- Liberalização total do comércio de produtos tropicais e produtos para diversificação
- Desgastes das preferências

E - Membros de adesão (à OMC) recente
F- Países menos adiantados
G -Acesso aos mercados para o algodão
H -Economias pequenas e vulneráveis

III Concorrência nas Exportações

A - Disposições gerais sobre a concorrência nas exportações
B - Compromissos em matéria de subsídios à exportação
C- Créditos à exportação, garantias de créditos à exportação e programas de seguro
D - Empresas comerciais de Estado exportadoras de produtos agropecuários
E - Ajuda alimentar internacional
F - Algodão

IV - Controle e supervisão
V - Outras Questões

A - Iniciativas setoriais
B- Impostos diferenciais à exportação
C - Indicações geográficas
D - Proibições e reduções à exportação

Anexos
A - Nova redação do Anexo 2 do Acordo sobre a Agricultura
B - Lista de indicações de produtos especiais
C - Economias pequenas e vulneráveis
D - Créditos à exportação, garantias de créditos à exportação e programas de seguro
E - Empresas comerciais de Estado exportadoras de produtos agropecuários
F - Ajuda alimentar internacional

(na continuação, a análise deste documento)

domingo, agosto 05, 2007

Acordo sobre a Agricultura - A retomada das negociações

Resultado da Rodada Uruguai, o Acordo sobre a Agricultura reconhecia, em seu Artigo 20, que o objetivo de longo-prazo - reduções substanciais e progressivas dos subsídios e outras medidas que distorcem o comércio, era um processo continuado. Para a continuidade desse processo estabelecia que as negociações seriam retomadas um ano antes do fim do período de aplicação. Valia o prazo concedido aos países desenvolvidos que era de seis anos. Como o Acordo entrou em vigor em 1 de Janeiro de 1995 a retomada das negociações deveria ocorrer no início de 2000.

No encerramento da Conferência Ministerial de Seattle (em dezembro de 1999), o Grupo de Cairnes - do qual o Brasil faz parte, deixou claro que a completa eliminação dos subsídios seria o fundamento do processo de negociações que seria iniciado logo a seguir.

Na Rodada Uruguai, ficou estabelecido que as medidas relacionadas ao comercio de produtos agropecuários seriam distribuídas em três compartimentos: verde, amarelo e azul.

No compartimento verde estariam incluídas todas as medidas que não provocam distorções no mercado, ou que provoquem muito pouca distorção. No azul, as medidas que tenham como objetivo a redução da produção, provoquem ou não distorções. O compartimento amarelo englobaria todas as medidas que distorcem o mercado, subsídios internos e à exportação entre eles. Neste caso o limite para os países desenvolvidos era de 5% do valor total da produção agropecuária. Ao final de 2000 esses países já deveriam ter cumprido o período de implementação, ou seja, já deveriam estar concedendo, no máximo, subsídios iguais a 5% do valor total da produção agropecuária.

As negociações do que hoje é conhecido como Rodada Doha (ou de Doha), começaram efetivamente em Março de 2000. E começaram com dois problemas que forçariam a abertura da Rodada em Novembro de 2001.

O primeiro deles eram as dificuldades dos países em desenvolvimento em implantar as mudanças internas necessárias ao cumprimento dos compromissos assumidos com o Acordo sobre a Agricultura. Faltavam a muitos desses países recursos humanos, financeiros e técnicos para a implementação do Acordo. Com os países desenvolvidos não havia carência de nada, exceto de vontade. O que levava ao segundo problema, nenhum deles havia cumprido sequer parte do compromisso de reduzir seus subsídios.

A solução para o despreparo e insuficiência de recursos humanos e técnicos poderia ser resolvido, o treinamento e assistência técnica a serem fornecidos pela própria OMC, por outras instituições internacionais, como a UNCTAD, e pelos países desenvolvidos que se dispusessem a fazê-lo. O segundo problema era, e continua sendo, muito mais complicado. Dependia, como depende, da concordância dos países desenvolvidos e da União Europeia, que congrega quase todos os países da Europa. Os dois Membros da OMC mais envolvidos eram (e são) os EUA e a UE.

As negociações, após a retomada, foram divididas em duas fases: até Março de 2001, a primeira e até Março de 2002 a segunda. A Rodada de Doha começou em Janeiro de 2002, incorporando o processo de negociações sobre a agricultura que efetivamente reiniciou em fins de março.

Como parte da Rodada de Doha, deveria ter sua primeira etapa concluída em 12 meses, quando deveriam estar acordadas as modalidades que seriam apresentadas e (desejava-se) aprovadas na Conferencia Ministerial de Cancun, no final de 2003.
O prazo para a Rodada de Doha estabelecia que a mesma deveria estar encerrada até 1 de Janeiro de 2005 . O que significava dois anos para que as negociações chegassem a bom termo.
Ocorre que Cancún não foi bem sucedida e, para as modalidades que já apresentavam problemas em março, não foi possível dar uma solução aceitável aos participantes.
As Conferencias Ministeriais são realizadas de dois em dois anos. O prazo máximo para 1 de Janeiro de 2005 foi perdido em Cancún, já que somente em fins de 2005 seria realizada a VI Conferência. O que ocorreu em Hong Kong e, como em Cancún, não houve nenhuma conclusão satisfatória. Interrompida em Julho de 2006, a Rodada tenta tomar novo fôlego.